terça-feira, 2 de setembro de 2008

1972: Um Ano Que Ainda Dói no Ouvido

Como estamos em plena “Semana da Pátria” reproduzo com pequenas modificações texto publicado no http://www.amigosdedelmirogouveia.blogger.com.br/ em 24 de novembro de 2004. Na época ele rendeu alguns comentários. Mas não custa nada resgatar o mesmo e tentar fazer o nosso blog caminhar um pouco mais.

Ano 1972 - Alguns fatos. Cenário Mundial: A Guerra do Vietnã se aproxima do fim. Henry Kissinger, secretário de estado americano, negociava nos arredores de Paris uma saída honrosa para os EUA. Na Olimpíada de Munique 12 atletas israelenses eram feitos reféns e depois mortos por militantes da OLP. Nixon visitava a China.

Cenário Nacional: Imperava o auge da ditadura militar. Governo Médici. Imprensa censurada. Lei de Segurança Nacional. O capitão Lamarca, talvez a figura mais conhecida da resistência de esquerda, já havia sido assassinado no sertão da Bahia. Gil e Caetano voltavam do exílio londrino.

Cenário delmirense (macondiano): Eu fazia a 4ª série primária no Grupo Escolar Francisca Rosa da Costa. A escola tinha apenas quatro salas de aula. Diretora: Teresinha Bandeira. Professora: Sônia Camilo. (minha colega, aqui ao lado, acabou dar uma risada. Caramba: você saltou de Henry Kissinger e Olimpíadas para o 4º ano primário em Delmiro Gouveia. Isso é que eu chamo de viagem).

Eu, uma criança, naturalmente não sabia nada do que rolava pelo mundo e muito menos no país. Os anos de chumbo caiam no lombo do povo. Eram os tempos do Brasil: Ame-o ou Deixe-o (minha colega aqui do lado está completando: o último que sair, apague a luz do aeroporto). E a abertura lenta, gradual e segura ainda nem era projeto. Isto só viria acontecer nos anos Geisel. Mas aí já é outra história.

Certa vez, a palavra subversivo, foi pronunciada de maneira baixa, sussurrada e entreolhando para os lados. Assim como comentavam que alguém estava com câncer. Era algo mais ou menos assim: Os filhos do Sr. Leite e do Sr. Dom foram presos em Recife. Isto ouvi ali na casa do meu avô: Rua da Matriz, 222.

Creio que eles militavam no movimento estudantil. Nunca soube o que eles tinham feito de fato. Mas sei que “subversivo” era algo muito grave. Aliás, se algum leitor que os conheceu quiser contar a história por aqui ficarei bastante grato. Matarei a curiosidade infantil.

Mas aqui estou a tergiversar. Voltando ao Grupo Escolar (vizinho ao Bar da Tripa).

Enquanto tudo isto acontecia, lá estávamos nós na frente da escola, todos trajando camisa branca com o escudo da escola no bolso, calças curtas ou saias azul-marinho, meias brancas e os inesquecíveis e confortáveis sapatos conga nos pés. Hasteando a bandeira, mãozinhas em cima do peito esquerdo a cantar em altos brados o hino do sesquicentenário da independência. Era isto mesmo. Fazia 150 anos que o D. Pedro I tinha soltado o brado do Ipiranga. E não é que este hino, de tanto ser cantado (afinal todas as quintas-feiras cumpria-se o ritual) até hoje permanece em minha memória. E às vezes me pego inconscientemente cantando-o. Isto que é foi uma lavagem cerebral bem dada.

O detalhe interessante era que se alguém fizesse alguma gracinha ou saísse do tom, levava umas chocalhadas na cabeça (é isto mesmo que você está lendo, chocalhadas. Afinal o chocalho usado em pescoço de cabras e bode, na escola tinha a dupla função de servir de “campainha” e como instrumento de repressão aos “meninos malinos” (putz, esta expressão fui buscar longe, não?). A Teresinha não perdoava. Eu nunca levei. E bom deixar isto bem claro. (risos).

Bem, será que você também lembra do hino? Então relembre. Eis aí o dito cujo.

Hino do Sesquicentenário da Independência

(Canção de Miguel Gustavo)

Marco extraordinário

Sesquicentenário da independência

Potência de amor e paz

Esse Brasil faz coisas

Que ninguém imagina que faz

É Dom Pedro I

É Dom Pedro do Grito

Esse grito de glória

Que a cor da história à vitória nos traz

Na mistura das raças

Na esperança que uniu

No imenso continente nossa gente, Brasil Sesquicentenário

E vamos mais e mais

Na festa, do amor e da paz (Bis)

E dessa época? O que você lembra?

13 comentários:

Ricardo Dreia Ramos de Menezes disse...

Rapaz!!! Eu nem sabia da existência esse hino.
Eu lembro que todos os dias, antes de iniciar as aulas, tinha que cantar o Hino Nacional.
O Hino Nacional sempre achei de uma chatice sem igual.
Já o Hino da Pátria eu adorava, não por uma questão de patriotada. Musicalmente, é muito bonito. É aquele com a passagem: "Já raiou a liberdade no horizonte do Brasil". Ou é o Hino da Independência? Sei lá!!! Faz tanto tempo que não escuto mais esse hino!!!

Anônimo disse...

Caramba César!!!! Você fez uma viajem no túnel do tempo e eu me sinto obrigado a embarquar junto com você. Afinal, estava nessa classe também e, como um bom "menino malino" que fui, tomei umas boas chacoalhadas na hora do hino, assim como, uns bons castigos durante a aula. Zé Lisboa que o diga, meu cúmplice das malinisses!!!
Mas foi uma turma muito boa. Não faz muito tempo que você postou uma foto que eu enviei dessa turma.
Abraço a todos.

César Tavares disse...

Pois é Ailton deixei a deixa para vc comentar mesmo. Pois afinal fazíamos parte da mesma turma do saudoso GEFRC. Ainda lembrava de tal hino?

Luiz Orleans disse...

Bom, eu tinha apenas 5 anos. Não vivi isso em intensidade. Vaga na memória a tênue lembrança de material de propaganda nos cadernos de Escola, aqueles de papel paltado e pregados com grampo bem firme. A capa era, geralmente, uma alusão aos valores cívicos da época, na contra-capa o Hino Nacional e da Bandeira, as vezes até o Hino do Soldado... Lembro-me de uma molecagem que aprontei na fila de entrada da Escola, era a 2a. Série; quando apontei um piolho na cabeça de um colega e a turma caiu de pau no coitado. A meninada gritava: "piolho, piolho; olha só que piolhento..." E batiam na nuca do garoto. Não me lembro de quem era, nem faria menção ao nome por questão ética. Até me arrependo de ter feito isso, mas já foi... Coisas de menino. No mais, viva o Povo Brasilero! Do correspondente em Salvador, Luiz Orleans.

Luiz Orleans disse...

Dado ao falesccimento do cantor e compositor WALDICK SORIANO, ontem, pela manhã, me animei a escrever um pequeno artigo em meu BLOG. Como ele faz parte de uma das tantas lendas urbanas da nossa Macondo sertaneja, ofereço o texto a apreciação de todos e todas. Do correspondente em Salvador, Luiz Orleans

César Tavares disse...

Luiz vou espiar e se possível comentar. Do Waldick nos comentários do blog anterior sempre lembravam do show que ele deu no Cine Pedra e estava cheio de "água que passarinho não bebe" e esculhambou Macondo de ponta a ponta. Virou uma lenda urbana delmirense este show.

abraços

Anônimo disse...

César, sinceramente não lembrava, tinha uma vaga lembrança dessa letra, a melodia nem pensar!! Infelizmente hoje os hinos, exceto dos clubes de futebol, já não tem mais a importância e valor cívico que deveriam ter. O que a meu ver, é uma grande perda para todos nós.
Perder a nossa própria história!!
Um abraço.

Ricardo Dreia Ramos de Menezes disse...

Certa vez, o Nelson Rodrigues afirmou: "O patriotismo é o último refúgio dos canalhas"
Patriotada está muito ligada ao despotismo. Sempre que um governo déspota toma o poder, junto vem o culto patriótico, que na verdade é o culto, escamoteado, aos governantes.

Anônimo disse...

ler todo o blog, muito bom

Cris Rocha disse...

Estava eu aqui hoje, em 2017, procurando o hino do sesquicentenario no google, para mostrar à minha filha, quando me deparei com o seu blog. Não tive como deixar de comparar o seu relato com a minha vida em 1972. Eu em Minas Gerais, 2° ano primário, o mesmo tipo de uniforme escolar, blusa branca de tecido e calça ou saia azul marinho. A bandeirinha do Brasil balançando numa mão e cantando o tal hino. E sim, era uma lavagem cerebral, pois me lembro dele até hoje. E a coisa era tão padronizada pelos militares que você e eu, mesmo estando muito longe, tínhamos o mesmo tipo de uniforme e hábitos escolares. E o tal lema "Brasil:ame-o ou deixe-o", eu na minha ignorância infantil e interiorana achava o máximo, pois pra mim quem não era patriota tinha mesmo era que vazar do país. Mal sabia eu que isso era um recado para aqueles que sofriam com a ditadura. Nem sabia o que era isso. E hoje vejo que, se esse governo golpista e corrupto que aí está pudesse, usaria esse mesmo lema conosco, que estamos contra ele. Mais atual impossível.

Unknown disse...

O que não tinhamos nessa época ?. A bandalheira que há hoje, a corrupção e essa vergonhosa falta de justiça. O Brasil tá podre. Só falta quebrar.PS: Essa era a liberdade que os subversivos queriam, a liberdade de roubar sem serem incomodados.

Unknown disse...

O que não tinhamos nessa época ?. A bandalheira que há hoje, a corrupção e essa vergonhosa falta de justiça. O Brasil tá podre. Só falta quebrar.PS: Essa era a liberdade que os subversivos queriam, a liberdade de roubar sem serem incomodados.

César Tavares disse...

Caro João Carlos,

Tudo isto que vc menciona existia sim. Apenas o povo que não sabia. Afinal não havia imprensa livre, não havia MP atuante. Não havia Tribunais de Contas, Não havia redes sociais e cidadãos atentos. Desconhecer historia e fatos não justifica defesa de quaisquer ditaduras.

César.